29.7.07



O PRIMEIRO CONTO DE LLANSOL


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O primeiro texto de ficção publicado por Maria Gabriela Llansol é o conto «Empregada», aparecido no Diário de Notícias de 12 de Setembro de 1957,e logo com uma gralha de palmatória no nome da autora: Gabriela «Lauzol»!
Texto já sintomático, se não de um estilo, pelo menos de uma atitude. Radical, e anunciando caminhos que os «pobres da História» e os «acentrados» da sociedade seguiriam mais tarde, nos livros posteriores a O Livro das Comunidades. Mas também a linguagem deixa já entrever a escolha inconfundível da via da imagem, e a recusa quase programática da metáfora — mesmo quando esta parece estar presente: «As groselhas são bagas vermelhas. O sumo desliza em gotas de volúpia pela boca, suja o pescoço e o vestido. As laranjeiras são redondas. Há sol dentro de cada groselha e dentro de cada laranja.» Como no dicionário de uma estirpe com olhos de ver na dobra do mundo.Ou como num desenho de Klee: o recorte nítido da coisa, trepassada por um olhar que vê o que vai lá dentro, e existe. E, aqui e ali, uma postura que evidencia já uma «crítica civilizacional» que se iria acentuar e transformar em marca inconfundível do modo llansoliano de ver o mundo:«As paredes do bar estavam pintadas de verde escuro. Mas nenhum desses verdes era igual ao dos plátanos que ladeavam a casa.» E a presença de uma cabeça que não pensa o que sente (o corpo), mas sente o que o corpo pensa (com pensamento já libidinal?). Aossê avant la lettre, intuição da sua bi-humanidade, talvez a maior das revoluções na hermenêutica pessoana? — «No bar, como na estrada, deslizaram ondas de ruídos, essências e cores. Ondas mortas, pensaria Isabel, se a sua cabeça pensasse o que sentia.»