14.10.14

«M. G. LLANSOL: 
O ENCONTRO INESPERADO DO DIVERSO»
O catálogo da exposição


Foi apresentado no sábado em Guimarães o catálogo da exposição de obras de Ilda David', com fotografias de Duarte Belo e objectos do acervo do Espaço Llansol, que pôde ser vista no Centro Internacional das Artes José de Guimarães (CIAJG) de 27 de Julho até ontem. O catálogo, organizado pelo director artístico do CIAJG, Nuno Faria, numa edição da Oficina (produtor da exposição) e da editora Documenta, reproduz os ambientes da exposição e o processo de trabalho de Ilda David', e contém textos de Maria Gabriela Llansol (de Lisboaleipzig, Finita, O Senhor de Herbais e dos Livros de Horas), de João Barrento, Maria Etelvina Santos e Nuno Faria.
No lançamento do catálogo, que aconteceu no próprio espaço da exposição, intervieram, para além dos dois artistas, que deixaram depoimentos pessoais sobre a sua relação com o universo Llansol e com a própria autora, os autores dos textos do catálogo, que lançaram diferentes olhares retrospectivos sobre a exposição e os seus possíveis significados.
Nuno Faria situou a exposição e a sua concepção como proposta de um voo sobre diferentes zonas temporais:
« A montagem é a linguagem da arte contemporânea. É uma linguagem performativa, que se cumpre, que se corporaliza, que devém. Propicia um movimento que tem o poder de transformar. Fulgoriza a realidade, tal como a obra de Llansol, retirando o peso espúrio que as palavras e as coisas carregam.
Tratava-se de conceber um espaço em suspensão, de propor um voo, mais do que uma caminhada, de fazer prevalecer a dimensão temporal sobre a dimensão espacial na percepção do espectador.
Verter o espaço fundado pela escrita em espaço habitado e atravessado por corpos e por fantasmas, o negativo do corpo, num jogo de presença/ausência, metonímico da própria experiência vital em que se constitui o contacto com a escrita llansoliana, verdadeira experiência dos limites.
Que outra obra mais intensamente resignifica, reinveste, anima os objectos? 
O lugar fundado pelo museu é dos mais delirantes que possamos imaginar, porque para além de nele se encontrarem objectos de lugares distantes e tempos dissonantes, que convencionamos ou aceitamos dar como nossos contemporâneos, ali reconhecemos, encontramos por vezes, os gestos dos nossos antepassados».  
João Barrento tomou a exposição como um primeiro passo para lançar os fundamentos de algo que o Espaço Llansol procurará levar a cabo futuramente: a construção de um grande ATLAS-LLANSOL (por enquanto ainda um proto-atlas), que nesta exposição pode ter tido um ponto de partida, ainda parcial, mas importante como indiciador de um sentido possível para aquela construção.
Clarificou a noção de «Atlas» (a partir de Aby Warburg, mas indo além dele pela mão de Llansol, que em alguns cadernos de escrita já pensou o seu «atlas», e por vezes lhe dá mesmo esse nome!) no sentido de um mapa interactivo e rizomático – escritural, visual, figural, mental, espacial, afectivo – que, mais do que fazer convergir conjuntos de imagens para descobrir afinidades escondidas, con-figura paisagens e, dentro delas, linhagens, para mostrar «muita parecença, nenhuma semelhança» (Caderno 1.52, p. 190).
A partir de um organigrama completo de todo o acervo e do mapa figural de Llansol, fez uma primeira abordagem a partir de uma apresentação visual, em que convocou, num primeiro levantamento, o universo de escrita (os livros de M. G. Llansol – mas não necessariamente os títulos particulares desses livros) e todos os sectores do arquivo-Llansol pertinentes para a futura construção global desse Atlas-Llansol.

Por seu lado, Maria Etelvina Santos, com vista a evidenciar a experiência do outrora no agora, do improvável e do diverso, que esta exposição nos propõe a partir da Obra de Llansol, sintetizou  alguns procedimentos de leitura a partir de noções (presentes em Walter Benjamin) que facilmente dialogam com outras de M.G. Llansol, e que parecem fazer parte de uma mesma tentativa de compreensão do mundo. Partindo da concepção de espaço-tempo como uma entidade conjunta e tetradimensional, com os seus diversos pontos ou acontecimentos, e da noção de instante como densidade e não durabilidade, aproximamo-nos das noções llansolianas de «lugar», de «imagem-figura», de «vislumbre» ou de «fulgor» (que estão na base dos seus «encontros de confrontação») e que, por sua vez, dialogam (como uma alma crescendo, diria Llansol) com as noções benjaminianas de «imagem dialéctica», de «constelação», de «origem» ou mesmo de «experiência».
O encontro de confrontação que esta exposição põe sob os nossos olhos e nos faz viver, dá-se à leitura como uma «icnologia» (um mapa de vestígios, mais do que um simples conjunto de ícones) de pontos luminosos que estabelecem constelações de semelhantes na diferença, amplificando, assim, o nosso modo de experimentar o mundo.
O catálogo da exposição está já disponível nas livrarias.