24.2.19

DOIS QUE «HERDARAM AS MARGENS»

A tarde de ontem na Casa de Julho e Agosto proporcionou mais um desses encontros imprevisíveis, im-prováveis e sem antecedentes, mas muito reveladores de fundas afinidades electivas entre os modos de escrita e as visões do mundo de Maria Gabriela Llansol e do poeta Fernando Echevarría (que no próximo dia 26 de Fevereiro completará 90 anos e receberá a Medalha de Mérito Cultural), dois autores para quem a condição de exílio – do país imerso em guerra e ditadura, da sociedade e do mainstream da literatura – foi pressuposto central de toda uma vida de escrita.
Disto, e da figura deste poeta que tão bem conhece, nos falou ontem a Profª Maria João Reynaud, vinda expressamente do Porto para esta conversa em que procurámos seguir alguns dos fios que ligam estes dois mundos – as distantes raízes ibéricas, a longa experiência do exílio, a vocação «oficinal» no rigoroso trabalho de escrita, a comum constatação da «obra inacabada» ou do livro contínuo, a importância do «ver» a par do decisivo lugar do pensamento na escrita de ambos, guiada por uma original dialéctica entre enigma e transparência, ou a condição ontológica de duas Obras que buscam e revelam o enigma do Ser, oferecendo a quem as lê uma ampla, e pouco comum, respiração da língua e da palavra...
Tais pontes transpareceram também nas leituras paralelas feitas no fim, dando a ouvir de forma viva as correspondências entre poemas (de Echevarría) e fragmentos de prosa (de Llansol), seguindo pelos atalhos de tópicos e temas como: «A alegria de escrever», «O visível e o invisível», «A sensibilidade do olhar», «A Figura» e «O corpo», «O júbilo do silêncio e da solidão», «O enigma da alma» ou «Escreviver»...
Temas presentes também no caderno que fizemos para esta sessão: «A áspera matéria do enigma»: Maria Gabriela Llansol e Fernando Echevarría.