«O OFÍCIO DE CRESCER»
A Letra E recebe a infância de Maria Gabriela Llansol
No recomeço regressámos às origens. Sábado à tarde, na Letra E, vibraram ecos, imagens, objectos, escrita, que trouxeram até nós a infância de Llansol, alguns dos seus lugares e momentos vários em que o olhar retrospectivo a revive e pensa, para transformar em escrita «circunstâncias ou factos que funcionavam como mitos em gaveta própria» (Caderno 1.53, p. 169)
Hélia Correia falou da sua imagem desta infância escrita, libertando-a de qualquer réstia de sentimentalismo ou de simples biografismo. As suas referências maiores, que documentou com leituras de Um Beijo Dado Mais Tarde e Amar Um Cão, foram de ordem figural: a Témia presente na estatueta a que a Maria Gabriela um dia atribuiu esse nome, e Jade, que na infância era «o cão do futuro». Estas duas figuras representam, no texto, duas ordens de ideias que sustentam grande parte da escrita de Llansol: a recusa da impostura da língua e a afirmação de uma vontade própria de todo o Vivo.
João Barrento lembrou e mostrou, a abrir, a última e bela edição de Llansol em francês, acabada de chegar, e remeteu para o caderno que acompanhou a sessão – «O ofício de crescer» - Lugares e tempos de Llansol (I - A infância, 1931-1942) –, e que será o primeiro de uma série que percorrerá todos os tempos e lugares de M. G. Llansol. E apresentou brevemente o projecto de filme Seguindo o Olhar, que data de 2009, e do qual Daniel Ribeiro Duarte mostrou depois algumas sequências, filmadas em dois dos lugares da infância de Llansol: Alpedrinha e Vila Pouca de Aguiar.
A pequena «maquete do filme», como lhe chamou o Daniel, surpreendeu pelo modo como capta realidades que se amplificam, a partir de pormenores, em planos longos, como o tempo da infância: o quintal, o tanque e a roda da nora em Vila Pouca de Aguiar, a oliveira, os gatos, a Fonte das Sete Bicas, a estação abandonada de Alpedrinha, ou a magia da Serra da Gardunha sempre em fundo (que também a Hélia evocou): «Passei parte da minha infância sentada no degrau de uma porta só a receber a noite: a Serra da Gardunha coroava o meu horizonte...» (Avulso 0133).
O projecto-guião do filme Seguindo o Olhar, e as «tabelas de filmagens»
Nas sequências resgatadas pelo Daniel a partir do material filmado nessas nossas andanças de 2009, tudo vive de pequenos vestígios encontrados, atmosferas, seres, que os próprios textos (e algumas fotografias do arquivo) de M. G. Llansol nos sugeriram, discreta ou explicitamente.
Alguns desses textos ficam na montagem que se segue, o resto pode ser lido no Caderno da Letra E feito para este dia.