16.3.13

O «AMBO» NA LETRA E



Devido às férias escolares e à semana da Páscoa teremos de adiar a sessão dedicada à relação M. G. Llansol-Augusto Joaquim, que passará para o dia 6 de Abril, como sempre às 17 horas.
Voltaremos a dar notícias mais próximo dessa data. E as surpresas vão ser muitas!

10.3.13


Mais uma tarde  de revelação e iluminação para muitos dos que foram ontem à «Letra E» do Espaço Llansol. A poeta (e professora da Faculdade de Letras do Porto) Ana Luísa Amaral abriu, de forma aliciante e rigorosa, várias portas de entrada no universo e na escrita da maior poeta americana – do seu tempo e ainda do nosso –, a enigmática, surpreendente e inimitável Emily Dickinson.


A sessão inaugurou o nosso ciclo «As Figuras do Texto» (de facto, já iniciado o ano passado com Hölderlin e Pessoa/Aossê), que irá continuar. Na apresentação da nossa convidada, a maior especialista de Dickinson em Portugal (pode descarregar-se e ler-se a sua tese de doutoramento Emily Dickinson-Uma poética do excesso aqui: http://hdl.handle.net/10216/16155), João Barrento destacou algumas convergências entre estas três mulheres de três séculos tão diferentes, pela via dupla da escrita e da tradução. Ana Luísa Amaral e Maria Gabriela Llansol – e, no espaço discreto da sua reclusão relativa, sobretudo nas suas muitas cartas, também Dickinson – escrevem sobre e contra a peste dos medíocres no mundo de ontem e no de hoje. As três falam, na sua escrita poética, de e por enigmas, véus translúcidos, fingimentos, cada uma com os seus. Todas «põem a mão no pensamento» (Llansol) e o pensamento no corpo e o corpo na escrita. Com a noção clara de um caminho, não imposto, mas escolhido pelo «poder de decisão», ou também ditado pelo «medo» incontornável de todo o acto de escrever (que Dickinson também conhece), que não é mero entretenimento ou gesto inócuo de promoção pública – e vivendo todas na «casa do possível», que outra não há nem pode haver nestas coisas da escrita.


Emily Dickinson e Maria Gabriela Llansol escrevem também, reconhecida e ostensivamente, fora dos cânones, os sociais e os literários, uma fazendo «não-poesia», a outra situando-se «na margem da língua, fora da literatura». E também Ana Luísa Amaral é uma poeta com um rosto claramente identificável na nossa poesia de hoje, pela subversão que opera do expectável, pela ironia subtil, mansa e dissolvente da sua poesia.
Tal como Llansol, que publica, sob o pseudónimo de Ana Fontes, os Bilhetinhos com Poemas de Emily Dickinson (Colares Editora, 1995), também Ana Luísa Amaral traduziu a poeta americana numa antologia de 100 Poemas de Emily Dickinson (Relógio d'Água, 2010), tendo no prelo, e na mesma editora, uma nova antologia com 200 Poemas. Nestas aventuras da passagem, nas transposições em que se «muda a grafia e a cor do A de Rimbaud» (escreve M. G. Llansol em Inquérito às Quatro Confidências), ou nas travessias dos terrenos esburacados, elípticos, de «excesso», e traçados tantas vezes pelo avesso, da poesia de E. Dickinson, a mão é sempre a mão que trai, numa traição que é o estigma de Babel – mas nem por isso deixamos de jogar este jogo de palimpsestos imperfeitos, de sobreimpressões de língua a língua. Llansol dirá, sobre estes ritos de passagem que praticou de forma muito sua, e única, que se trata apenas de momentos em que «alguém», mais uma figura do Texto, nos bate à janela da casa pedindo para entrar; ou ainda, num papel avulso do espólio, de «um trabalho de poeta e de ladrão». E Ana Luísa Amaral, que reincidiu nesta aventura com os seus 200 Poemas, fala num dos seus poemas próprios («Babel», do ciclo «A Leste do Paraíso») de «um gesto de ciúme» de Deus: «Diz-se que a punição se cumpriu justa / no divino saber / Mas foi decerto gesto de ciúme, / desajeitada afirmação de quem / já não tem demais céus // a conquistar.»


Ana Luísa Amaral guiou-nos pelos meandros, pelas contradições e pelos abusos  da edição dos poemas de Dickinson, destacou, com exemplos da poesia e das cartas, em transcrição e nos manuscritos, os processos da escrita da «virgem de Amherst», a subversão dos cânones, a ironia latente na relação com os seus interlocutores, a indecibilidade de género nas transições entre bilhetes e poemas. E deixou claro para quem, com prazer e proveito, a ouviu que o modo de escrita próprio de Dickinson – como também de Llansol – é o da «visão que a palavra vai ocupar». E que também aqui, como no rio de escrita de Maria Gabriela Llansol, o poema nunca está feito, nunca há texto «acabado».




3.3.13

LEMBRAR LLANSOL


20.2.13

DICKINSON NA «LETRA E» ADIADA


Como Emily Dickinson («I dwell in Possibility»), como Llansol («nada é, tudo está sendo»), também nós «moramos na casa do Possível»! – o mundo assim o exige, o que ontem parecia uma coisa, hoje é outra.
Vem isto para explicar mais uma vez, com as nossas desculpas (mas a razão é forte!), a nova mudança de data para a sessão da Letra E sobre Emily Dickinson e Llansol, com a poeta Ana Luísa Amaral: passaremos do dia 2 de Março para o dia 9 de Março, às 17 horas. E isto porque no dia 2, por todo o país, muitos (também os que gostam de Dickinson e Llansol) irão gritar bem alto, na rua, "Que se lixe a troika!".
E a Verdade – que, diz Dickinson, não exclui a Beleza, mas é sua irmã! – impõe-se. Por isso não será a Beleza da poesia de Dickinson e da sua leitura por Ana Luísa Amaral que nos irá impedir de entregar «a nossa carta ao mundo», de fazer ouvir a nossa Verdade aos que nos querem impedir de pensar, transformando-nos em marionetas e impondo-nos uma vida degradante e humilhante!
Iremos então todos à manifestação do dia 2 de Março!!
E esperamos que venham muitos, todos os que puderem, para ouvir falar de Dickinson e Llansol em 9 de Março, na Letra E do Espaço Llansol, em Sintra.

28.1.13

A FOTOGRAFIA – O TEXTO
A PAISAGEM – O CORPO

Faz hoje exactamente um ano que abrimos a «Letra E» do Espaço Llansol. Ao longo deste ano, esse espaço aberto e criativo acolheu, até anteontem, catorze sessões que foram trazendo a Sintra uma pleiade de criadores que aqui dialogaram com a escrita e o pensamento de Llansol e um público muito diversificado, que nos granjearam mais visibilidade e sobretudo nos trouxeram novos amigos e colaboradores.
Há um ano escrevíamos, a abrir a «Carta de princípios da Letra E», palavras cuja acutilante – e preocupante – actualidade se mantém, e redobrou:
«Neste momento histórico em que o pensamento e a criação livres se vêem cada vez mais encurralados por agentes de poderes planetários sem rosto e por uma informação redundante e paradoxalmente desinformativa, porque totalmente acrítica, aquilo que a indústria da cultura e a paranóia do consumo consideram 'produtos' da literatura e da arte degenerou, com algumas excepções, em matéria mercantil ou mero alimento de um gosto duvidoso ditado pela vontade inexpressa, mas dominadora, de novas massas anódinas e manipuladas, no plano do visível, pela própria inconsciência de si, nelas inculcada por mecanismos que todos conhecemos há muito.»
Mas também aí se anunciavam as linhas de orientação do nosso fazer, e o espírito que nos anima. E esses não mudaram, tal como não mudaram em décadas de escrita na Obra de Llansol, entre o seu «livro-fonte» e o seu canto do cisne. Anima-nos, como a ela, e por isso está também na nossa «Carta de princípios», «a necessidade de saber 'o que é o corpo, / o que é a luz, / o que é a força, / o que é o afecto, / o que é o pensamento, / o que é a figura'. É todo um programa que podemos seguir.»
E vamos seguindo, com todos os que nos acompanham e connosco colaboram. Para eles vai hoje o nosso obrigado, o nosso afecto e a promessa de continuar.
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A tarde de sábado levou-nos às paisagens perdidas e sublimes da Islândia, pela mão da fotógrafa Teresa Huertas, e abriu horizontes inesperados sobre o tema da paisagem, trazidos pela escrita de Maria Gabriela Llansol, a que as nossas amigas Helena Alves e Cândida Pargana deram voz a abrir a sessão, com leitura de textos de O Livro das Comunidades, Finita, Lisboaleipzig, Parasceve, Onde Vais, Drama-Poesia? e O Senhor de Herbais.
A fotógrafa trouxe-nos fragmentos do seu Diário da Islândia, que serviram de fio condutor para a conversa, completada visualmente pelas suas fotografias expostas e pela viagem final com projecções que documentaram alguns momentos da história da «paisagem habitada» (pelo corpo humano), na pintura e na fotografia.
Desse Diário deixamos aqui alguns fragmentos de que partimos para essa viagem na Letra E.


15 de Agosto, Skógasandur, na estrada para Vik
À beira da estrada. Tempestade de vento na duna.
Seduz-me a vastidão dos campos de areia negra árida, com uma linha plana de horizonte definida a poente interrompida pontualmente por alguma rocha. Desenho mentalmente os planos de uma imagem que me parece familiar.
Sessão fotográfica I. Caminho vertical no plano da imagem. Caminho na duna no sentido da pedra. Marcações do meu corpo na areia. A linha que se desenha. Acções várias no percurso.
Sessão fotográfica II. Caminho horizontal no plano da imagem. Caminho na linha do horizonte em direcção à pedra grande. Jogo com a ilusão dos elementos.


18 de Agosto, a caminho de Jokulsárlón
(A experiência do esplendor e da generosidade da natureza)
A paisagem continua mágica. Quilómetros de estrada estreita separam a montanha de cores diluídas, que se perde nas nuvens, da planície de lava-turfa verde pálido, que se perde numa linha de mar.
O grande Vatnajokull começa a surgir. Em cada curva uma nova miragem. É um corpo branco, imenso, e desce majestosamente entre dois flancos da montanha até ao plano vasto de cinzas vulcânicas. Já não há sol. Desapareceu no tempo de uma nuvem. Línguas de gelo aproximam-se de nós. A estrada é agora uma superfície rude que invade o tapete de turfa macia. A seta indica Fjallsárlon. Avançamos, atraídos por uma força que nos conduz os olhos. E quando esta força nos conduz também os passos, é porque nos guia até uma revelação. O glaciar move-se em espiral sobre a montanha. O lugar é sublime. O chamamento da Beleza é uma atracção pelo abismo.

(...)
Mais abaixo, sobre uma das colinas, um círculo de pedras desenha-se no solo. O círculo, forma mágica, minha figura electiva, veio ao meu encontro. Impossível resistir ao chamamento do lugar. O círculo convida-me a entrar. Caminho dentro do círculo. Conto vinte e cinco passos lentos. Conto quarenta pedras. Uma das pedras pertence à terra. É grande e está semi-enterrada no solo. Todas as outras, na sua diversidade, ocupam diversos pontos do círculo, e foram colocadas sabiamente. (...) Entre brancos, azuis, cinzentos e negros, a natureza diverte-se. Não pensa.


19 de Agosto
A experiência da paisagem tem de ser vivida com o corpo, com os sentidos.
A fotografia apenas pode registar fragmentos mínimos do percurso. Como diz Hamish Fulton: «Um objecto não pode competir com uma experiência.»
A fotografia é apenas a ficção da vida.


22 de Agosto, Vogar
Vulcões negros e tapetes de verde esguio, lamas que fervem, vapores que irrompem das entranhas da terra, águas que jorram para o céu, desertos, labirintos de rocha, campos de lava, lagos, glaciares, cortinas de água, auroras boreais. Estamos verdadeiramente no princípio e no fim do mundo, entregues à nossa condição de impotência, perante este desafio desigual, o desafio de uma força magnética, brutal, fulgurante e encantatória, que não nos julga nem teme. (...) A cada mudança de luz, uma nova paisagem. Permanente, só mesmo o silêncio.


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Llansol e a paisagem:

Como se as paisagens fossem um enorme écran onde eu visse a história humana.
(Caderno 1.14, p. 272)

Queria partir para longe e rapidamente, mas não queria ser confrontada a uma qualidade inferior de paisagem.
(Caderno 1.06, p. 2)

Jardim: órgão inteligente, órgão sensível do metabolismo da paisagem.
(Caderno 1.13, p. 290)

Afectos_________ afectos não afectam a paisagem.
(Dossier dactiloscrito DOA07, p. 1, 1989)




A Letra E em 26 de Janeiro de 2013:
(Clique na imagem para aumentar)


(A exposição de Teresa Huertas estará ainda na Letra E até 9 de Fevereiro)

21.1.13

FOTOGRAFIA E PAISAGEM NA «LETRA E»

No próximo sábado, dia 26, teremos na «Letra E» a fotógrafa Teresa Huertas, que expõe uma série de fotografias de paisagens habitadas (pelo seu próprio corpo, em lugares remotos da Islândia), obras que servirão de ponto de partida para uma conversa sobre o lugar da paisagem no mundo de M. G. Llansol, e sobre a obra da própria fotógrafa e as ideias e intuições que alimentam este e outros trabalhos seus.
Teremos disponível nesse dia um caderno com textos de Llansol sobre a paisagem e a reprodução das fotografias de Teresa Huertas expostas na «Letra E».


E voltamos a lembrar: os que quiserem vir mais cedo, a partir das 15 horas, poderão fazê-lo e conversar connosco e fazer sugestões sobre o nosso programa e o nosso trabalho, no espírito da «troca verdadeira» que é o do universo llansoliano.

14.1.13

MARIA VELHO DA COSTA LEMBRA LLANSOL

Em entrevista ao jornal Público, de 13 de Janeiro, Maria Velho da Costa revela algumas das suas «afinidades electivas» com escritores portugueses, e refere-se a M. G. Llansol por duas vezes, nos seguintes termos:

(...) eu andei em letras e germânicas, e fui tendo afinidades electivas que de um modo geral se mantiveram, como a Maria Gabriela Llansol e o Herberto Helder, onde há emoções mais contraditórias, complexas, com interesses como perturbação. Interessaram-me poetas e escritores que tivessem um trabalho sobre a linguagem e a língua, mas não só. Quando me dizem que o meu trabalho é sobre a língua, é-o também, mas não só. Isso é omitir o trabalho com a linguagem.
(...)


Quem são os seus pares?
Acho que sou um bocado ímpar. Não no sentido grandioso, mas qual é o escritor português que eu possa dizer que seja mais da minha família? Talvez o José Cardoso Pires. E o Nuno Bragança. Posso ter uma admiração enorme e não sentir que seja meu par. Duas figuras com as quais tenho uma aproximação muito diferente são a Agustina e a Maria Gabriela Llansol. São duas escritas e duas maneiras de estar na literatura completamente diferentes. A Llansol, da primeira vez que a vi, meteu-me medo. Tinha uma relação com a escrita onde não havia distinção entre vida e escrita.

E para si há?
Para mim, há. Esse medo que me causou foi como se estivesse perante uma forma de santidade. Eu disse-lhe isso na única ocasião que tive para falar com ela. E ela disse que não havia razão nenhuma: «Eu sou uma pessoa normal».

9.1.13

OS CANTORES DE LEITURA
NO TEATRO NACIONAL

No próximo dia 15, e na série de leituras encenadas que vêm sendo feitas no Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa, no âmbito do «Projecto Teia-Poesia e Contos», poderão ouvir-se excertos de Os Cantores de Leitura de M. G. Llansol, seleccionados por Margarida Lages e lidos por Guilherme Faria e Paulo Lages.
A entrada é livre, às 19 horas. Mais informação aqui:


8.1.13

O PROGRAMA DA «LETRA E»
e
As conversas da troca verdadeira

De Janeiro a Abril falaremos de paisagem e das suas configurações no texto de Llansol (com a fotógrafa Teresa Huertas), da poesia de Emily Dickinson (com a poeta e professora Ana Luísa Amaral), da relação entre Maria Gabriela Llansol e Augusto Joaquim, mostrando parte do espólio, ainda não divulgado, deste último (textos, cadernos, correspondência, desenhos e colagens) e teremos ainda uma sessão para os mais pequenos, com uma versão especial de Amar um Cão escrita por Hélia Correia.
Pode ver-se o programa clicando na imagem abaixo.


Entretanto, a Direcção do Espaço Llansol decidiu inaugurar o novo ano com uma nova iniciativa: conversas abertas com sócios e amigos do Espaço Llansol que queiram fazer-nos sugestões, trocar ideias e opiniões:




28.12.12

 LLANSOL NO NOVO ANO: 
«A VONTADE DE ARQUIVO»

Nos milhares de páginas de cadernos, agendas, folhas dactiloscritas e papéis avulsos de toda a ordem que nos deixou, Maria Gabriela Llansol anota com frequência interessantes reflexões sobre a necessidade e o fascínio do «arquivo», faz listas de cadernos, livros e dossiers a organizar (seus e de Augusto Joaquim), antecipa o que poderá ser a sua casa, e tudo o que ela contém, depois da sua passagem. Essa «vontade de arquivo e catalogação» permite que o informe ganhe forma e novos livros nasçam, que aquilo que poderia perder-se não se perca, que o lugar do arquivo se transforme em pensamento vivo e, «audaciando-se» esse pensamento, a casa seja o contrário do museu e a Obra possa «ficar em toda a parte». 
É isso que nos move no trabalho que fazemos, continuando o seu, que foi, ele mesmo, também trabalho de arquivo e preservação, num outro «jardim que o pensamento permite», promessa e garantia de futuro para o seu texto.


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(Clique nas imagens para aumentar)