23.3.14

«A IMAGEM COM QUE SE RESISTE...»

A sessão de ontem na «Letra E» estava originalmente prevista para ter lugar numa ruína – em Sintra, onde há muitas, espelho de um estado de coisas em desagregação, ou noutro lugar deste país em ruínas. Acabou afinal por se fazer no lugar habitual, porque o tempo atmosférico, tal como a atmosfera asfixiante da pseudocultura dominante e do pensar, continuam frios e sem chama. O espaço da «Letra E» transformou-se, por isso, numa espécie de gruta – ilha, na visão de Llansol –, um dos lugares, não apenas simbólicos, mas reais, disseminados por aí, onde alguns não desistem de pensar e resistir.

 Cad. 1.10, 208: «Dagaia, a Ilha de Ana de Peñ[alosa]»
O lugar da Terra onde se resiste, contra a falsificação pelos mitos...

Dos modos vários dessa resistência se falou ontem, traçando amplos arcos que não se limitaram ao texto de Llansol, mas procuraram ir a algumas raízes, remotas e mais próximas, do «mal-estar na civilização» que é a nossa. Sobre as nossas cabeças pairava ontem uma «floresta do texto», algumas dezenas de fitas de papel com frases na caligrafia original dos cadernos de Llansol (de que deixamos aqui uma amostra, e que o video que inserimos no final dá uma imagem mais viva). Penduradas do tecto, eram como morcegos que, de cabeça para baixo, activam o seu sonar para auscultar este mundo às avessas, investindo em voo picado contra ele.


Foi o que fizeram os dois intervenientes que convidámos – o escritor António Vieira e o crítico e ensaísta António Guerreiro –, ao dissecarem a situação actual, com olhares amplos que vinham inevitavelmente pousar nas linhas do grande universo de Llansol, tendo já dele partido pela leitura dos textos e fragmentos inéditos que reunimos em mais um «Caderno da Letra E» (de onde transcrevemos parte da introdução de João Barrento, que contextualiza o tema da sessão). Os que vieram puderam levar para casa este caderno, e também uma ou mais das fitas de papel com autógrafos de M. G. Llansol que pendiam do tecto.

 (Da Introdução de João Barrento ao Caderno da Letra E)

Tivemos connosco dois actores que abriram a sessão com a leitura de alguns textos de Llansol: António Fonseca (que recentemente chamou a atenção com os seus espectáculos em que dizia Os Lusíadas de cor) e Helena Ávila (acabada de chegar da Ilha do Pico, nos Açores). E a conversa alargou-se à sala, e a temas como o lugar dos editores hoje; os sentidos (ominosos  e também promissores) da «comunidade», em Llansol e outros, ao longo do século XX; as linhas de demarcação entre utopia e ucronia na «comédia humana» de Llansol e na sua leitura do mundo e da História; a sua inserção na constelação do «fim do humanismo» e a construção de um novo «projecto do humano», trans-humano e radicalmente novo; enfim, as formas de resistência «imanentes», no plano de uma escrita como a de Llansol, que só por si, na sintaxe, desestrutura o pensamento estabelecido, num registo «atonal» que inquieta e nos mantém despertos (como bem salientou a pianista brasileira Gilda Oswaldo Cruz, que ontem esteve mais uma vez entre nós).
Traçaram-se, assim, algumas cartas de rumos, e sentiram-se os ventos que sopram da «Ilha de Ana de Peñalosa», pela mão daquela que escrevia já, em Na Casa de Julho e Agosto (1984): «Eu sou a nota fora das sete da comunidade das beguinas...».

17.3.14

«A IMAGEM COM QUE SE RESISTE...»

No próximo sábado, 22 de Março, às 17 horas, teremos mais uma sessão da «Letra E», desta vez com a voz mais «política» de Llansol. A partir de textos seus, escritos entre os anos oitenta do século passado e o início deste, traremos mais uma achega à discussão e indignação em curso sobre o estado deste país e do mundo. Com outras vozes, que disso falarão a partir desses textos – as do escritor António Vieira e do crítico e ensaísta António Guerreiro –e que lerão alguns deles – as do actor António Fonseca e da actriz Crista Alfaiate.

Como sempre, haverá um caderno de textos que procura transmitir as dimensões várias da revolta, da «Restante Vida contra o mundo», na Obra de M. G. Llansol, que desde cedo se decide por uma «ordem» que, paradoxalmente, ou não, é a de quem assume como sua condição «espalhar a justiça e a desordem», subvertendo os padrões instituídos do gregarismo capitalista-consumista e, nesse contexto, também da pseudo-cultura em que vivemos.
Quem vier poderá desta vez levar para casa um autógrafo de Llansol, frases manuscritas que são como setas disparadas contra o estado de a que chegou o país e o mundo.

16.3.14

LLANSOL NO BRASIL

1. A partilha do incomum


O texto de Maria Gabriela Llansol continua a fazer o seu caminho por terras brasileiras, também por lugares onde a sua presença até agora não era tão frequente.
É o caso da Editora da Universidade Federal de Santa Catarina (http://www.editora.ufsc.br), onde acaba de sair  um importante volume colectivo com ensaios e textos inéditos de M. G. Llansol, organizado por Maria Carolina Fenati, nossa colaboradora muito próxima e grande conhecedora da Obra e do espólio de Llansol. O livro intitula-se Partilha do Incomum. Leituras de Maria Gabriela Llansol, e tem contributos de quinze estudiosos e escritores portugueses e brasileiros, como se pode ver pelo índice abaixo (clique na imagem para aumentar).

Como escreve Carolina Fenati a abrir,   
Este livro – que reúne leituras do texto da escritora portuguesa Maria Gabriela Llansol (1931-2008) e fragmentos inéditos de seu espólio – é um gesto de acolhimento da sua escrita no momento em que ela começa a ser editada no Brasil. A publicação de três diários – Um falcão no punho (1985), Finita (1986) e Inquérito às quatro confidências (1996) – amplia a possibilidade da partilha desses textos e seus fragmentos, que, vindos de Portugal já circulavam de mão em mão entre vários leitores, relançam-se agora no devir das suas leituras.  
(Entretanto, mais um livro – Um beijo dado mais tarde –  saiu em 2013 na Sete Letras, do Rio de Janeiro, e outros virão). 
No final da nota introdutória a organizadora  explicita o título do livro e esclarece a intenção de mais esta importante e diversificada publicação sobre o universo singular de Llansol:
Escrever com os textos de Maria Gabriela Llansol – partilhar o incomum que nos é oferecido – é dizer que os textos só permanecem na medida em que partem, só não desaparecem quando são transformados pela leitura que os contra-assina, que com eles escreve afirmando o seu excesso em relação a qualquer leitura. Como escreveu Eduardo Prado Coelho, esses textos convidam a ler «até ao limite em que o entendimento é já a alegria do desentendimento» e exigem a seriedade e a paciência de uma reflexão que, reconhecendo o movimento que lhe escapa, abre linhas de fuga através das quais tudo pode sempre recomeçar. Cantar a leitura talvez seja desejar a conversa infinita, buscar o exercício da palavra como a relação mais íntima com o que é partilhável sem medida.



2. Algumas «trocas verdadeiras»

No site Ler Jorge de Sena, da responsabilidade da Profª Gilda Santos, conhecida seniana da Universidade Federal do Rio de Janeiro, pode ler-se um informado artigo da Profª Maria de Lourdes Soares sobre a presença de Jorge de Sena, da sua obra e da sua transformação figural, na escrita de Maria Gabriela Llansol. Sena e Llansol já haviam sido objecto de um outro artigo no mesmo site, por Tatiana Pequeno (com o título «Llansenas»:
e agora o rasto de Sena e outros contemporâneos, como Vergílio Ferreira ou Eduardo Lourenço, na Obra de Llansol é detalhadamente analisado com recurso ao profundo conhecimento que a autora tem da Obra e do universo de Llansol, e a muita informação recente incluída nos Livros de Horas que vimos editando.  O artigo pode ler-se aqui:

14.3.14

LLANSOL E A «SENSUALIDADE 
DO INVISÍVEL»

No próximo dia 19 de Março, entre as 16 e as 17.30h, a Profª Cristiana Vasconcelos Rodrigues (da Universidade Aberta e membro da direcção do Espaço Llansol), fará uma conferência na Universidade Católica de Lisboa (Edifício da Biblioteca João Paulo II) em que falará de «Maria G. Llansol: o texto como busca da 'sensualidade do invisível'».
Fica o convite a todos os leitores de Llansol e amigos do Espaço Llansol.

3.3.14

A PRESENÇA FRAGMENTADA 
DO GRANDE ESPAÇO AUSENTE...

É dia de lembrar Maria Gabriela Llansol. Com o seu texto e a luz que dele emana: